27 de novembro de 2012

Tradição no bairro da modernidade


             Para quem não aguenta mais a "americanização" que o Rio, e particularmente a Barra, vêm sofrendo, a recente inauguração de uma loja sem o glamour que costuma caracterizar as lojas do bairro surge como um colírio aos olhos. E, por que não, também como sonho de consumo de vários moradores. Inaugurada há um mês no Barra Garden, a Oficina do Botão vem atraindo clientes simplesmente pelo o que oferece: todos acessórios para o velho e bom futebol de mesa, popularmente conhecido como jogo de Botão.
            Para entender o fenômeno que esta loja pode causar no bairro, é fundamental ficar por dentro da pesquisa realizada pela Oficina do Botão, em parceria com a Liga de Futebol de Mesa do Município do Rio de Janeiro (LFMRJ), para descobrir os focos de concentração de botonistas. Encabeçando a lista, Tijuca, Vila Isabel e adjacências, logo abaixo, a Barra. “A pessoa foi evoluindo e vindo para a Barra a procura de lugares mais seguros”, diz Adriano Moutinho, dono em sociedade de Marcelo Coutinho, da Oficina. Outra forma eficaz de compreender o fenômeno é perguntando para qualquer homem acima de 30 anos se ele jogava Botão. A resposta será um sonoro “sim” acompanhado de um brilho no olhar. Muitos já não tem suas coleções, mas se prontificarão a lhe contar como era esse tempo. “A maioria das crianças que joga hoje é porque os pais ou avos ensinaram”, afirma Adriano, que começou a jogar quando era moleque por influência dos irmãos mais velhos.
            Reconhecido como esporte em 1989 pelo extinto Conselho Nacional de Desportos (CND), o Botão era jogado nas ruas e praças e todo menino tinha seu time. Inicialmente os “jogadores” eram aqueles antigos botões de capas de chuva e de vestidos, o que explica o nome, ou antigas fichas de ônibus. Mas também fazia parte da diversão confeccionar o próprio time, e ai valia usar ossos, marfim, casca de coco e galalite. Tirando os de coco, os outros hoje são objetos de colecionador, chegando a valer 200 dólares. Atualmente, os botões são feitos de acrílico ou madrepérola, e é possível encontrar de todos os clubes e seleções.
            A criação deste esporte genuinamente brasileiro é um campo onde só existem chutes, ninguém sabe precisar a data, mas já era de se esperar que fosse emplacar. Se o futebol é a paixão nacional, imagine tê-lo ao alcance das mãos, onde você não é só o dono da bola, mas do time e do campo também! "Jogava muito sozinho. Armava o time e fazia campeonatos, dava vida ao botões, então o Botafogo era sempre campeão", lembra Zanon Palitot, alvinegro convicto e professor de Historia, que defende a tese que o jogo de Botão seja contemporâneo ao próprio futebol, uma forma popular de reproduzir o campo, restrito a elite de então.
            Só que nem tudo era tão fácil. Para adquirir uma maleta, por exemplo, o carioca precisa “importar”  uma da Bahia. Foi quando, há 11 anos, Adriano começou a confeccionar goleiros e maletas. Depois partiu para os botões, e no melhor estilo “sacoleiro”, levava toda produção para os campeonatos e vendia ali mesmo. Hoje, são duas lojas especializadas, a da Barra e outra no Iguatemi Shopping.
            Mais que brincadeira de criança, o futebol de mesa possui Liga profissional, federações em vários estados e três modalidades: carioca, paulista e baiana. A mais praticada no Rio é a ultima, e também a mais difícil. Cada jogador só pode dar um toque. Na regra carioca, valem três e na paulista, doze. Para quem já tem seu time, mas não onde jogar, a mesa da Oficina pode ser alugada por 10 ou 30 minutos. Para quem quer começar, o kit básico inclui um par de times, goleiros, traves e palhetas, bolinhas e a mesa. É uma tradição que merece ser perpetuada.


ops, não lembro o ano

16 de novembro de 2012

Israel bem na mídia

     Lendo hoje meu mural no facebook tive a impressão de que todo conflito é a mesma coisa, falamos as mesmas coisas, batemos nas mesmas teclas. Mas de repente me toquei que dessa vez tem sido diferente. Ou seja, será que todo trabalho de hasbará, aquele trabalho de formiguinha enfim está dando resultado?

     Pelo menos eu tenho visto algum resultado. Se no último conflito percebemos que por mais que nossa intenção fosse atingir a comunidade maior, nossas publicações rodavam e rodavam somente entre nós. Ninguém de fora da comunidade judaica curtia ou compartilhava nossas angústias e problemas. Que aliás não eram somente nossas, eram mundiais. Desta vez, logo no primeiro dia do conflito, amigos meus não judeus não só curtiram, como comentaram favoravelmente à Israel.

     O jornal O Globo, que é o que eu leio aqui em casa, foi muito bem. A jornalista Daniela Kresch honrou a profissão relatando um fato. E foi perfeita. Imparcial, acima de tudo. Parabéns! 







Qual a verdade?

Eu pensei muito se colocava ou não este texto que encontrei numa busca 
ultra rápida pelo Google. E quando digo rápida, quero dizer na primeira 
página de resultados do Google. Ou seja, acessível a qualquer pessoa.
O texto é da agência de imprensa italiana Adnkronos, fundada em 1963, com 
uma fusão entre duas agências, Kronos (fundada em 1951) e Agenzia di Notizie 
(fundada em 1959). Atualmente é de propriedade de Giuseppe Marra Comunicações. Em 2003, a agência lançou o seu escritório Internacional 
(Adnkronos International), com notícias e reportagens em árabe e em Inglês, 
principalmente do mundo árabe. O texto que fiquei pensando se colocava ou 
não, esclarece sobre a criação da página no Facebook pelos jovens egípcios e 
vem sendo apontada como o início da atual crise no país.

Resolvi publicar porque como sempre as pessoas compram o primeiro peixe que as vendem, e quando se trata de Oriente Médio, nem sempre as coisas são tão simples como aparentam ser. Só para mostrar que não é pela democracia, nem por emprego 
ou por fome que estes jovens estão fazendo tudo isso, vale a pena publicar o 
referido texto. Ele é datado de 25 de julho de 2010.


Boa Leitura,


Marcella Becker
http://www.kehilatmoriah.com.br/site/index.php/qual-e-a-verdade/


Cairo, 25 jul (AKI) – A Irmandade Muçulmana no Egito lançou um fórum de discussão no Facebook, o popular site de redes sociais.

Um grupo de jovens muçulmanos decidiram colocar a Irmandade Muçulmana no Facebook depois que receberam o sinal verde para fazê-lo do segundo homem em comando da Fraternidade, Mohamed Habib.

Os criadores do projeto decidiram chamar a si mesmos de "célula eletrônica para estudantes da Irmandade Muçulmana" e seu objetivo é empurrar o mundo para um retorno do Califado Islâmico [um estado muçulmano] ".

A Irmandade Muçulmana foi banida pelo governo egípcio, que acusa o grupo de incentivar a violência, a fim de estabelecer um estado islâmico.

Esta nova ala jovem decidiu escolher a Internet como uma forma de espalhar a sua mensagem.

Sua atividade política não é limitada ao Egito, mas destina-se a todos os muçulmanos ao redor do mundo.

O novo fórum de discussão no Facebook se baseia em cinco pontos.

O primeiro é a organização de protestos em todos os países muçulmanos para a salvação do Islã e questões da nação islâmica.

O segundo refere-se a propagação das histórias do profeta Maomé em relação ao califado.

O terceiro ponto é um pedido a todos os imãs para falar sobre esse assunto em seus sermões.

O quarto e quinto é a distribuição de folhetos para lembrar os muçulmanos da importância do califado e sensibilizar todos os partidos e organizações islâmicas a apoiar esta iniciativa.

Este fórum no Facebook foi aprovado pelo Habib, mesmo ele acreditando que este grupo de jovens não são realmente militantes do seu movimento.

"Eu não acho que os jovens da Irmandade Muçulmana façam algo parecido com isso porque eles não podem pensar desta maneira", disse Habib, em entrevista à rede de televisão árabe por satélite Al-Arabiya.

"Nossos jovens seguem a direção da administração e eles não funcionam separadamente, a partir de atividades individuais, sem esperar pela decisão comum do movimento", disse ele.

Apesar das observações feitas por Habib, outros líderes da Irmandade Muçulmana, como o parlamentar, Hamdi Hassan, têm criticado fortemente a iniciativa do grupo de jovens.

"É baseado em uma campanha que não tem sentido e pode ser lida como uma divisão interna de seu movimento promovido pela nova geração", disse Hassan.





12 de novembro de 2012

Overtraining



E NÃO É QUE MERCURIALI TINHA RAZÃO
Complicações antes restritas a atletas chegam as academias


     Alguém ainda consegue lembrar do tempo em que academia era sinônimo de capricho e atleta de vagabundagem? É, não faz tanto tempo assim. Mas a ciência evoluiu e com ela uma nova realidade instaurou-se em nossa sociedade. Assim como tecnologias da F1 são adaptadas para carros populares, o que antes era restrito aos atletas incorporou-se ao cotidiano popular. Hoje é comum um paciente sair do consultório médico com a recomendação de ingressar em alguma prática desportiva. O mais louco é que esse relacionamento entre medicina e exercícios físicos em prol da saúde remota do século XVI, é e creditado ao professor de medicina Geronimo Mercuriali, autor do primeiro livro ilustrado em medicina do esporte. A partir do século XVIII, graças ao entendimento das escolas filosóficas que corpo e mente se destinguiam e a visão religiosa de que o corpo era objeto de tentação, este conceito foi sendo abandonado para retornar com força total nos últimos anos. Tudo bem, isso faz um bem danado para inúmeras enfermidades e, é claro, para nossa auto-estima, mas da forma aleatória como vem sendo seguida essa recomendação, daqui há muito pouco tempo outra realidade exclusiva aos profissionais do esporte será inserida no vocabulário comum: a sindrome do overtraining. 

     Como o nome diz, é o excesso de treinamento associado a distúrbios nutricionais e do sono que podem acarretar aumento da ação do sistema nervoso simpático que reflete com o aumento da freqüência cardíaca, pressão arterial e gasto calórico (perda de peso muscular), náuseas e vômitos, insônia, lesões repetidas, depressão do sistema imune com maior incidência de doenças oportunistas (resfriados), baixo rendimento, depressão e perda da libido. “Há dois tipos de overtraining, um que é por exercícios monótonos - uma série enorme do mesmo exercício - e o tipo que é devido a conjugação de treinamento, competições e o estado psicológico do paciente naquele momento”, explica a Dra. Fernanda Alt do Nascimento, uma das 11 fisioterapeutas que integram a equipe supervisionada por Nilton Petrone da clinica Fisiobarra. Ela vai além e traça um perfil do quadro atual: “Atualmente as mulheres na faixa etária dos 15 aos 30 anos são mais afetados que os homens porque a cobrança estética na mulher é maior. Se você passar três horas em uma academia, verá que são as mesmas mulheres, que não comem porque não podem ganhar peso, que malham nesse tempo. Não são atletas, a gente chama de "atleta de fim de semana". É o cara que joga bola só nos finais de semana ou aquele que vai a academia sem ter um acompanhamento ou o copia de outros, e nem sempre o exercício que é adequado para um é adequado para todos, então deve haver uma série personalizada, pelo menos a princípio”, alerta. 

     Seguindo essa orientação, fomos conversar com um especialista. Há dois anos trabalhando na academia Estação do Corpo, que concentra em suas duas unidades 6.000 alunos, o professor de musculação e avaliação funcional Marcos Soares dos Santos, aconselha: “Já é sabido que acima de 1:30hs de exercícios é mais que suficiente para obter benefícios. O certo é trabalhar dentro de uma intensidade especifica para obter uma melhora no condicionamento. Por exemplo, quando se faz um treinamento de força, o ideal e que esta varie em torno de 80% do limite máximo de esforço, o que faz que a pessoa utilize mais as estruturas e fibras musculares e tenha resposta num espaço de tempo menor. Com isso você consegue fechar um programa de 40 minutos com 8 exercícios de 12 repetições. Se você considerar que a pessoa faz uma aula de ginástica, 1hs, e 40 minutos de atividade aeróbica, terá preenchido esse tempo”. 

     A triatleta Fernanda Keller concorda que a qualidade do treinamento é fundamental: “No começo eu treinava muito mais, hoje preciso menos para atingir meu potencial”, diz, com conhecimento de causa. Há 20 anos praticando triathlon, seis vezes medalhista de bronze no Ironman e hexacampeã do Troféu Brasil, Fernanda treina 5hs por dia seis vezes por semana, natação, ciclismo, corrida e musculação, além de fazer yoga, shiatsu, massagem sueca e bioenergética. Parece cansativo, mas ela diz que aprendeu a importância do descanso, o que faz bastante. 

     Agora, atenção: atividade física depois das 19hs, nem pensar. De acordo com o endocrinologista e professor de Educação Física Oswino Pena, esta prática afeta o sono e o apetite. “A pessoa tem que dormir a quantidade de tempo necessária para sentir-se bem e não ficar com sono ou cansada durante o dia. O sono é dividido em dois tipos: rem e não rem. O rem é aquele em que a pessoa descansa mais. Para ter mais este tipo, deve-se reduzir bastante o nível de estresse”, ensina. 

     Como esta síndrome deriva dos atletas, é claro que eles estejam predispostos a adquirí-la. Profissionais do esporte são unânimes quanto a “culpa” da evolução dos esportes na última década. “O atleta sempre tenta se superar e aí ele não tem limite. Um centésimo faz diferença para um velocista, e ele só atingi isso treinando. É prejudicial, mas tem esse lado da competição, que hoje em dia é muito maior, a superação em cima dos índices são enormes. Se você pegar um atleta olímpico de qualquer modalidade e um da Olimpíada de 80 (Moscou), verá que a diferença de tempo é absurda”, observa Fernanda Alt. Só para se ter uma idéia, pegando o recordista de 1992, o marroquino Noureddine Morceli, e o primeiro recordista, o americano Kiviat (1912), com uma diferença de 27 segundos entre seus tempos, Morceli chegaria 189 metros na frente de Kiviat! 

     Como este é um pais de experts no esporte por excelência, não e difícil imaginar a pressão psicológica que estes atletas sofrem. O que isso tem a ver? Simplesmente porque o overtraining é um estresse físico e geralmente esse tipo de estresse esta relacionado ao mental e vice-versa. “Por exemplo, o cara que tá treinando para um Vale Tudo fica tão tenso que passa a ter um estresse mental. Vinte e quatro horas antes de uma competição a freqüência cardíaca pode aumentar de 70 para 110 batimentos. Isso aumenta o gasto energético e na hora de lutar ele já esta cansado. Tanto que tem uma série de atletas que são bons em nível recreativo, mas não servem para competição. O atleta bom é um fenômeno. Nem todos conseguem, dedicação exclusiva pode melhorar, mas não é garantia de sucesso. Pega um Wallid, ele é ruim, mas vence na insistência. Se ele fosse bom lutador, ninguém ganhava dele. Outros são talentos, como o Libório, só que ele fica tenso, não aguenta o estresse. Um cara que é bom tecnicamente e para competir é o Bustamante. Fica calmo, tranquilo. O que ele tem de ruim? O preparo físico. Ele tem uma boa resistência aeróbica mas pouca força”, diagnostica Oswino. 

     E por falar em Wallid, ele garante que depois de várias crises de overtraining, quando febres, resfriados e dores musculares eram constantes companheiras, tomou juízo. Escolado, diz ter adquirido sensibilidade para diagnosticar o possível aparecimento da síndrome. Como os outros, reconhece que o pique do treinamento antes das competicoes somado ao estresse emocional facilita o overtraining. Estresse esse que o zagueiro do Botafogo Denis diz estar isento. Fora apenas de um dos jogos que o clube disputou no Campeonato Brasileiro, quando o que não faltou ao time foram motivos para estresse, Denis credita seu controle emocional a sua espontaniedade e a ausência de problemas físicos a vida regrada que leva. “Consigo repor com alimentação e sono. Você deve abrir mão de certos prazeres em prol do esporte”, diz. 

     Mas que alimentação “milagrosa” é essa? Para começo de história, ela não tem nada de mágica. O que acontece é que o que ingerimos responde a 50% das respostas do exercício físico, daí a importância de uma dieta equilibrada. Aliás, já dito por Herodicus de Selymbria, contemporâneo de Sócrates, ao descrever a “ginástica médica”, onde o treinamento deve ser balanceado nas atividades físicas e na dieta. “O ideal e fazer seis refeições por dia, de 3 em 3hs, com poucos alimentos em cada uma, contendo lipídeos, glicideos e proteínas. A melhor dieta é aquela que o paciente consegue fazer”, ensina Dr Oswino. 

     O diagnóstico de overtraining é um caso a parte, até porque ninguém chega num consultório com esta reclamação. Na maioria das vezes, o que as leva a procurar ajuda medica são as repetidas lesões e o cansaço fora de propósito. Ou seja, quando o processo já instaurou-se. “No início, na fase da crise, é essencial a pausa no treinamento. Uma a duas semanas, depende de cada caso. Como nós pregamos a recuperação rápida, o paciente nunca fica mais de 1 mês em tratamento por causa de tendinite ou estiramento”, ressalta a fisioterapeuta da Fisiobarra. Lá, o trabalho de recuperação é feito utilizando frio, calor, água e movimento, configurados e adaptados a cada paciente. Na Estação do Corpo o aluno não é privado de malhar, mas tem sua intensidade de trabalho reduzida. Como o afastamento pode afetar o psicológico do atleta, Oswino recomenda ações recreativas: “Tipo jogar futebol. É até bom para combater o overtraining uma atividade que relaxe a pessoa”. 

     Também conhecida como burnout, staleness, síndrome da fadiga crônica, overwork, overloadtraining, overfadigue, overstrain e desajuste de adaptação, a enfermidade pode atingir qualquer um. Nem tanto assim. “Quem segue um treinamento adequado, associado a um bom descanso e boa alimentação, dificilmente terá um quadro de overtraining”, simplifica Oswino. Ou seja, ou você se cuida ou começa a educar seus ouvidos para escutar esta expressão daqui em diante.

Royler Gracie

   Ele não é grande nem forte, quesitos que, em sua opinião, destacam um atleta. Muitos o consideram um dos melhores e mais técnicos faixas preta em atividade. Não é para menos. Com 1,73m e 66kg, Royler Gracie é, como o pai, a prova da eficiência do Jiu-Jitsu, Arte que por pouco não aprendeu antes mesmo de andar. "Não conheço ninguém que competiu mais do que eu em jiu-jitsu. Só na preta foram mais de 200 lutas. Não falo isso da boca para fora, tenho gravado", diz o único representante da família presente às duas edições do Campeonato Mundial. "Gosto de competir, de testar minha capacidade", simplifica. 

   Royler não é só único Gracie a participar de eventos de jiu-jitsu mas também é um dos poucos que permaneceu no Rio. É aquela velha história: como Narciso acha feio o que não é espelho, ele bem que tentou se mudar para Los Angeles mas não conseguiu morar mais do que dois anos longe da cidade que é a sua cara. "Não me adaptei. Acho o povo americano muito frio. Ninguém tem amigo, lazer". 

   E ele sabe do que está falando. Sua vida está enraizada no Rio. Aqui ele mora perto da praia do Arpoador - um dos melhores picos para surfar em sua opinião, os outros seriam Saquarema e Prainha - com a mulher Vera e as três filhas: Rayna, 10 anos, Rayssa, 8 e Rhauani, 6. Acostumado a casas cheias de crianças, é o sexto filho de oito irmãos criado com 21 primos de 1 grau, Royler já encomendou mais um para acompanhá-lo. "Ou faço um time de futebol de salão e ponho minha mulher no gol, ou faço um garoto para ficar de gândula para as meninas", fala sem saber ainda o sexo do herdeiro que chegará em janeiro. Como seguro morreu de velho, ele adianta que "a firma ainda não fechou". 

   Aqui também estão cinco das nove filiais da Ac. Gracie - Humaitá, Iate, Tijuca, Bonsucesso e Niterói - onde ele ministra aulas cinco vezez por semana. e supervisiona 1.300 alunos, somando as filiais de Manaus, Fortaleza, Belém e New Jersey. "Meu dinheiro hoje vem das aulas. Nem posso dizer que ganho com Vale-Tudo porque não faço muitos, até gostaria de fazer mais porque realmente ganha-se mais dinheiro, mas também você bota tua cara na reta", conta ele, que fez dois Vale-Tudos por achar que todo professor de Arte Marcial que queira saber seu limite, pisa num octagon. 

   E é a realização ou não de um Vale-Tudo que tem sido o assunto de dez entre dez rodas de lutadores. Afinal, o Rickson luta ou não? "Essas pessoas estão preocupadas com ele de uma maneira... Se ele não quiser mais lutar é problema dele. Cada um que faça sua carreira, isso que é importante", diz Royler, que por várias vezes também vê sua vida ser invadida por terceiros. "O brasileiro, até mais que os outros povos, se preocupa mais com a vida dos outros que com a própria. Nunca falei que tinha parado e não estou preocupado em dar a volta por cima porque não tenho que mostrar nada pra ninguém; tô sempre competindo contra mim mesmo, acho que este é meu maior defeito, então estou sempre buscando uma coisa a mais", esclarece, referindo-se aos boatos de que o Mundial seria seu último campeonato. Pura intriga da oposição que esquece que o introdutor da Arte no Brasil é pai deste faixa preta e aos 82 anos continua na ativa. 

   Se Royler vai ou não chegar a tanto, é cedo para dizer. Respirando Jiu-Jitsu 24 horas por dia, como diz, ele acredita que tudo o que se faz de bem, retorna da mesma forma. Treino forte e técnico de Jiu-Jitsu intercalados, mais corrida e musculação na ac. Heavy Duty, complementados pela adaptação do Judô ao seu jogo, foram sua fórmula para conquistar o bicampeonato mundial. Quanto a outro confronto com Amaury, ele registra a vontade e uma idéia: de uma luta casada. "Gostaria de lutar com ele em outras condições. Já tinha lutado sete vezes, meu coração queria fazer mais mas meu corpo não deixava, e não tive condições de oferecer à ele o perigo e a pungência de um lutador em sua primeira luta. Temos condições de fazer um grande espetáculo em outra ocasião". 

   Quem se interessa? Show é que não vai faltar, afinal, reunindo o nome, a técnica e a origem, Royler é a própria encarnação do Brazilian Jiu-Jitsu: aquele que nasceu e se criou no Rio, nunca vai abandonar a cidade e virou mania internacional sem perder as raízes. 


Patrocinio: ICJG, kimonos Machado; apoio de Pharmácia Equilibrium e Netinho 

Tristeza: Miséria e fome no país que eu tanto amo 

Alegria: Minha família 

Melhor momento: Nascimento das minhas filhas 

Pior momento: Ser injustiçado num campeonato quando você tem certeza que ganhou 

Sonho: Dar a volta ao mundo com minha família 

Consumo: Continuar sendo feliz fazendo o que gosto 

Não fez: Tudo que tenho vontade, faço 

Fez: Às vezes me arrependo de ser honesto demais e falar as coisas na cara 

Objetivo: Apesar de ser novo, acho que já consegui as coisas que mais queria na vida que eram, acho que é o que todo cara procura hoje, ter um bom trabalho, ser reconhecido e uma família maravilhosa 

Golpe: Aquele que flui mais fácil na hora, o que estiver melhor para mim 

Surf: Arpoador, Saquarema e Prainha 

Melhor e pior luta: Com o Peixotinho na Copa Lighting Bolt; Com o Márcio Feitosa na II Copa Pelé 

Melhor e pior que viu: Rickson com Sérgio Penha; Não vejo nenhuma pior, procuro sempre tirar proveito mesmo ela sendo ruim 

Adversário: Minha vida; Tô sempre brigando com ela 

Mulher: Fora a minha, Luiza Brunet 

Qualidade: Sinceridade 

Defeito: Às vezes sou um pouco estressado 

Superstição: Passar perto de escada perto de campeonato 

Mito: Acredito que da família que eu vim, tem que ser da família. Vi pouco meu pai lutar, apesar de tê-lo como um cara que está acima de todo mundo. Um cara que quando eu era garoto eu vi lutar bastante foi o Rolls 

Ídolo: Rickson 

Quem foi o melhor: Não faço essa comparação. Não tô preocupado se é ele, eu ou outro. Os dois (Rickson e Rolls) eram. Eram estilos diferentes. O Rolls era super agressivo, rápido e eu me espelhei muito no jogo dele. O jiu-jitsu que eu pratico hoje devo à ele, porque treinava com ele quando era garoto. Ele parecia um gato de tão rápido, acho que pensava mais rápido que o próprio raciocínio 

Rickson: Talvez conseguiu reunir um conjunto que os outros não conseguiram, que é força, peso, técnica agilidade e velocidade de raciocínio. Ele consegue prever a posição com uma velocidade muito grande. Eu me considero um cara muito bom mas não tenho esse conjunto, não sou pesado nem forte 

Jiu-Jitsu n 1: Tenho um pai, não como o n 1 do jiu-jitsu, que foi o mentor de tudo isso, e se a gente pratica jiu-jitsu hoje e tem um n 1, é graças à ele 

Octagon: Rickson 

Coleman: É um lutador como outro qualquer, não é uma máquina e tem o direito de perder; ele não é invencível 

Vítor Belfort: Tem muito a aprender ainda, ele é novo. A minha família já faz parte da história, não estamos querendo entrar 

Futuro do Vale-Tudo: Se não houver uma organizaçâo, já já vai se perder 

Futuro do Jiu-Jitsu: Muito mais organizado, capaz e objetivo 

Filosofia da Arte: Não compete à mim falar, ma à CBJJ 

Recado: Para você ser um grande campeão não basta só treinar, deve ter boas atitudes, boas vibrações, mas acima de tudo deve ter respeito 




Divinamente Protegido

   No escritório de sua firma de segurança - onde a Bíblia e livros sobre jiu-jitsu e segurança particular convivem pacificamente sobre a mesa - Mestre Francisco Mansour, ou simplesmente "tio Chico", me recebeu para responder essa e outras perguntas dando uma aula do verdadeiro significado da Arte Suave. 

   Descendente de um "tal" de Samuel que em 1210 ocupou uma região montanhosa do Líbano chamada Mansour, que deu origem ao único ramo da família, Francisco Mansour é o exemplo do homem que ousa sonhar. Criado no interior de Minas Gerais, veio para o Rio, se formou em Direito e há 32 anos exerce o cargo de delegado de polícia. Não por conscidência, o mesmo tempo que montou a academia Kioto. 

   Com a mesma simplicidade com que cita Demóstenes, Sócrates, Galileu Galilei, Pasteur e Abraham Lincoln - fato raro no meio - pede para continuar lembrado apenas como professor de jiu-jitsu. O que por si só não é pouco. Francisco Mansour é um dos doze que podem honrar a faixa vermelha e preta de mestre 8º grau e teve o privilégio de conviver com duas gerações Gracie nos 42 anos que dedica à Arte. Talvez não seja à toa que a explicação do brasão de sua família - uma mão saindo de uma nuvem - seja "divinamente protegido". 

T- O que é necessário para alcançar o título de Mestre? 

Mansour - Que o professor tenha no mínimo 50 anos de idade e 30 de magistério comprovados, essas são exigências da CBJJ, faz parte do Estatuto (NR: O parágrafo descreve a distribuição das vagas: 20 para mestre 7º, 12 para 8º, sete para grande mestre 9º e cinco para grande mestre 10º. Está escrito: "As categorias de grande mestre 10º não serão preenchidas jamais, uma vez que pertencem aos pioneiros do jiu-jitsu no Brasil"). Fiz uma festa para os decanos receberem suas faixas, mas quem teria a audácia de entregar a faixa ao criador do jiu-jitsu brasileiro? A solução foi cada preta (NR: João Alberto Barreto, Hélio Vigio, Pedro Valente, Róbson Gracie, Pedro Hemetério, Francisco Mansour, Rorion Gracie, Armando e Carlison Gracie) graduado por ele segurar um pedaço. O Hélio formou 22, mas afirma que se pudesse cassar pelo menos oito desses, o faria. 

T- O Sr. concorda? 

M- Sim. O jiu-jitsu não é uma modalidade de luta para as pessoas sairem brigando por aí, foi feito para defesa pessoal e 90% dos professores do Rio a desconhecem; não são professores. Lutador faixa preta qualquer um pode ser. Ele começa lutando, se preparando - igual cavalo de corrida - e começa a ganhar porque o jiu-jitsu agora tem rounds onde prevalece aquele que estiver melhor preparado fiicamente, o marombeiro. 

T- O conceito de que a técnica supera a força está se invertendo? 

M- Hoje ninguém luta para fazer uma finalização, criaram um monte de regras que atrapalha o trabalho do fraco. Uma inversão, por exemplo, vale dois pontos. O que é uma inversão? Nada. O Hélo acha que o lutador só deveria usar a gola do kimono. O jiu-jitsu visa demonstrar o domínio técnico sobre o adversário, e não para ficar amarrando a luta ou agarrando o kimono sujo do outro, ou tão apertado que não dá nem para pegar na perna da calça porque o cara já vem com o kimono preparado, sob medida; parece mais um collant. Não é o jiu-jitsu que eu aprendi nem o que ensino. 

T- Numa entrevista que vi do seu Hélio, ele dizia que os alunos não foram feitos para pensar, mas para executar. Isso é o correto? 

M- E de fato é. Não há necessidade de aprender um golpe a cada dia. Tem que repetir 10, 20, mil vezes a mesma posição. O Cara coloca aquilo no subconsciente e começa a fazer por instinto. É quando ele torna-se um verdadeiro lutador de jiu-jitsu, porque não precisa pensar para fazer, faz porque está acostumado. Agora vamos imaginar um treino do Rickson com o Royce, muito técnicos e bons. Aí não será só por instinto e aquele que errar, perde. A técnica do Hélio é jogar em cima do erro alheio; não é você que ganha, é o outro que perde. 

T- Por falar nisso, o que vêm a ser (o mito) Rickson Gracie? 

M- É um caso à parte. Tudo que Deus podia dar à um lutador de jiu-jitsu, deu à ele. Eu acompanhei seu crescimento, era comida na hora e descanso de 15 minutos depois. Às vezes estávamos em campeonatos, eu e o pai dele sentados à mesa, o Hélio assobiava e o Rickson vinha correndo para comer. O Rickson foi criado na mão, como costumo dizer. Foi preparado, moldado. O Hélio foi um escultor e esculpiu o filho no que ele é, o maior lutador do mundo, a meu ver. Depois dele vem o Royce, que também é privilegiado no tamanho e condição física e depois, como o mais técnico, o Royler. 

T- O senhor conviveu com o mestre hálio, poderia definí-lo? 

M- Hoje o Hélio é um mito, uma lenda viva. Deus dá dom à algumas pessoas. Pasteur veio ao mundo com a missão de inventar uma vacina que salvou várias vidas; Thomas Edison, a lâmpada. Comparo o Hélio à essas pessoas pelo bem que ele fez com seu jiu-jitsu, criado baseado no Indiano onde a técnica supera a força. É possível corrigir deficiências sérias nas pessoas; eu, por exemplo, era altamente agressivo, brigava à toa, e hoje sou esse homem de paz, calmo. Sempre segui o que ele falou e o resultado é o que tenho hoje. Têm defeitos como todo ser humano, mas tem qualidades que você não faz idéia. 

T- Seu pai era fã do Mestre Hélio. Como ele o conheceu? 

M- Meu pai faleceu há alguns anos, mas era um homem de uma evolução mental muito grande. Comparo-o muito com o Hélio, 80% da maneira de pensar deles era igual. Ele aprendia jiu-jitsu com um de seus funcionários que desetara da Marinha na época da guerra e tinha sido aluno do Hélio. No pós-guerra houve uma grande falta de farinha e meu pai tinha que vir ao Rio constantemente para abastecer sua fábrica de macarrão no interior de Minas. Numa dessas vezes, ele foi na academia do Hélio. 

T- E como foi o seu primeiro contato com o Mestre Hélio? 

M- Eu treinva Judô na ACM e ele chamava todo judoca de frouxo. Fui na academia dele para dizer que eu não era. 

T- Como era o jiu-jitsu nesta época? 

M- Muito bonito e muito técnico. A guarda de pernas era um negócio muito sério. Depois houve a necessidade de apressar a luta e apareceu o triângulo. Isso diminuiu muito a técnica porque 90% das finalizações hoje são triângulo e arm-lock na guarda. Os detalhes técnicos do jiu-jitsu são maravilhosos. 

T- O Sr. é apaixonado pela Arte ... 

M- Jiu-Jitsu é minha vida. A única coisa que sou fanático, no resto sou um cara normal como qualquer outro. 

T- O Krauss falou isso e que o resto era consequência. Até onde isso tem fundamento? 

M- Comecei uma academia de jiu-jitsu em função de competições, mas aprendi com o Hélio que Vale-Tudo e a parte financeira da academia não são a essência. A essência é o que você pode ajudar seu semelhante, é o que você pode fazer como educador. É o garotinho que não consegue abotoar a camisa ou amarrar o sapato porque não tem coordenação fina para isso e, de repente, você vê que ele começa a dar nó até em pingo d'água. Se o jiu-jitsu for bem administrado ele te faz superar qualquer problema físico ou psicológico, não digo neurológico porque jiu-jitsu não cura e nem é médico. Na minha academia tenho uma preparação de exercícios para aguçar a psicomotricidade da pessoa deficiente. Preparar um homem para enfrentar a vida é muito mais difícil do que preparar um homem para lutar no tatame. O homem já é lutador desde que o mundo é mundo, é um dominador por si só, temos que trabalhar o desenvolvimento deste intinto e não confundir agressividade com defesa. Há uma razão para um garoto só querer saber de confusão, e o primeiro passo é saber qual é. Esse é o trabalho que a Kioto faz, ela foi criada com a intenção de preparar a pessoa para o futuro. 

T- O Sr. organizou uma metodologia de trabalho dividida em dez livros com 42 aulas cada e 985 posições e reune-se a cada semana com os professores de sua academia onde cada um tem voz mas a opinião final é a sua. Como é isso? 

M- Eu aceito a personalidade de cada um. Na hora de ministrar a aula ele pode até criar uma maneira de fazer, contanto que siga o livro, que eu atualizo de tempo em tempo. Eles se revezam no comando das seis academias porque não gosto que ninguém se intutule o dono da boiada. Você não é minha aluna, é aluna da Kioto. Nenhum professor trabalha comigo se não tiver o 3º grau completo ou em curso. 

T- Porque a composição destes livros? 

M- Foi mais por ver a falta de sequência, de ordem cronológica nas academias que íamos. Nós tínhamos a defesa pessoal por escrito que o Hélio nos deu - uma criação dele - mas o jiu-jitsu em si, detalhes de luta, exercícios de coordenação, não existia nada. Criei um livro que chama "curso de adaptação". Antes do cara aprender defesa pessoal, dou este curso, aí já é uma maneira minha de ensinar, onde ele aprende noções de distância, movimento de ataque e esquiva, entrar numa queda, trabalho de quadril, assim ele se familiariza com o jiu-jitsu e parte para o segundo livro, que é a defesa pessoal. Ele aprende mais fácil e não esquece. O livro três são posições de luta. Por exemplo, do primeiro ao décimo livro, têm 42 estrangulamentos, 60 raspagens, 29 chaves de braço, que você só aprende com o tempo, gradativamente, o que eu chamo de ordem crescente de controle e inteligência. 

T- O senhor considera inviável a consciliação das atividades de professor e atleta. Porque? 

M- Como professor ele é obrigado a oferecer facilidade para o aluno aprender, aumentando gradativamente este aprendizado, então ele não estará com reflexo de lutador, mas de educador. Quando ele for competir, deve só treinar. Dando aula e competindo ele nunca vai ser nem uma coisa nem outra, não consegue chegar ao supra-sumo da coisa, a não ser que disponha de tempo para fazer as duas atividades paralelamente. 

T- A alegação é que ficou difícil manter-se só com o lucro da academia. Como lidar com isso? 

M- Obviamente, você dividir um bolo por dois é mole, todos comem. Mas quando você começa a dividir o bolo em 8, 10 fatias, diminui a quantidade e você continua com fome. A medida que minha família foi crescendo e coloquei meus filhos e sobrinhos trabalhando comigo, passei a dar aulas 4hs por semana e montei uma empresa de segurança para completar a deficiência financeira que me foi imposta. O que atrapalha muito também é que antigamente as pessoas eram obrigadas a frequentar as boas academias, hoje qualquer pé-rapado dá aula. Um faixa azul dar aula é o maior absurdo, ele não está preparado nem para ele, que dirá para preprar os outros. 

T- Como controlar? 

M- Quem deveria controlar era o Estado. A Lei nº 2.014 de 92 proíbe àquele que não for federado ministrar aula, mas tá cheio de faixa azul e roxa dando aula em colégios e condomínios, é mais barato. Às vezes, não sabem nem a idoneidade nem a índole do cara e ele tá ensinando às pessoas a seguirem seu caminho. O professor se torna um herói e o aluno vai imitar as falhas dele. A delegacia deveria autuar esses "professores" por exercício ilegal da profissão. 

T- Como destringuir? 

M- Hoje tem um monte de gente que trabalha bem com jiu-jitsu não sendo Gracie, e muitos que têm o sobrenome e trabalham mal. O Hélio é que fala o nome dos que servem ou não e não sou eu que vou repetir, é assunto de família deles. Meu nome é Mansour, não é Gracie e tive que lutar muito para chegar onde cheguei. Segui rigorosamente os caminhos que o Hélio traçou para eu ser o Mansour que sou hoje, respeitado, considerado no meio, conhecido internacionalmente e com uma academia conceituada. Para mim o Hélio é um homem que nasceu com uma estrela. Às vezes falo do Hélio de uma maneira quase que idolatrada. Não é isso. Ele é um homem como outro qualquer, passível de erros, mas com um caráter digno de ser imitado e um conhecimento que ninguém têm: o jiu-jitsu dele. Eu não chamo de jiu-jitsu Gracie, mas de jiu-jitsu do Hélio Gracie. Se eu disser jiu-jitsu Gracie estarei generalizando como se todos tivessem a competência do Hélio, e não têm. 

T- O que ocorre é que esses "assuntos de família" ultrapassam as quatro paredes e de repente aparece um Gracie criticando outro ou desprezando a palavra do Mestre Hélio. Qual sua opinião a respeito? 

M- Se falam do Hélio é por incopetência ou por mágoa. Na verdade todos eles devem o que são a ele, especialmente os mais velhos que foram criados por ele. A briga entre eles é pelo poder. Cada um quer ter mais. É interesse financeiro, é são essas coisas que atrapalham o crescimento real do jiu-jitsu. O Hélio manteve o escritório e eu a secretária da Federação por um ano porque ela não tinha como produzir, isso é amar o jiu-jitsu. Agora, o cara ficar ganhando dinheiro fazendo torneiozinho, vendendo isso ou aquilo não é amar a Arte, é interesse próprio, é pôr dinheiro no bolso. Daí que saem as brigas. No mundo inteiro, as guerras foram por interesse financeiro. 

T- Em outra ocasião o senhor disse que o Libório seria uma boa liderança. Porque? 

M- É um rapaz calmo, consciente, um líder e que até agora só me passou interesse pelo desenvolvimento do esporte. Tenho uma simpatia muito grande pelo Murilo Bustamante também, são pessoas que eu respeito muito pelo o que apresentam de luta. Não são caras que falam besteira, são homem que têm linhagem. Eu, por exemplo, daria a faixa preta aos dois sem nenhuma restrição. 

T- O Sr. crê num jiu-jitsu olímpico? 

M- É meu maior sonho. Aí verão o que é trazer medalhas para o Brasil. 

T- Mas é muito chão... 

M- É, mas nós vamos caminhar esse chão. Você ajudará do teu jeito e eu do meu, porque vou viver até os 108 anos, então tenho mais 50 para ajudar o jiu-jitsu. 

T- O Krauss também me disse que o senhor se emociona quando um ex-aluno seu leva o filho ou o neto para treinar na sua academia. Como é ver os filhos do mestre Hélio, que o senhor acompanhou o crescimento, lutando e ganhando? 

M- Quando eles estão lutando minha torcida é muito grande, é como se fossem meus irmãos. É muito gostoso pela amizade e vínculo que tenho com o Hélio. Os nossos filhos, os meus e os dele, são como a continuação da mesma família. Quanto tá competindo a academia do Royler contra a minha, lógico que estou torcendo para o meu atleta. 

T- E em relação aos filhos ou netos de seus ex-alunos? 

M- Isso é quase sempre, já estou na terceira geração. Eles levam o filho e pedem: "Tio Chico - eles me chamam de tio Chico - vê se o senhor faz com ele o que fez por mim". Chega a ser emocionante. Você já viu o Fabrício fazendo uma apresentação? Eu fico com nó na garganta, aquilo me emociona demais. Ele é um rapaz cego e consegue fazer aquele jiu-jitsu, ele foi campeão estadual, é muita coisa. Fabrício hoje é empresário, é ele que faz as medalhas da minha academia. 

T- Em que o jiu-jitsu ajudou na recuperação dele? 

M- Ele mesmo fala que o jiu-jitsu foi o apoio que encontrou. No princípio foi muito difícil para ele, inclusive foi preciso muita paciência em convencê-lo a voltar. Ele traz desenhos e discute comigo como se estivesse vendo, fico impressionado. Tenho pilhas de cartas de pais agradecendo nosso trabalho junto à seus filhos. Isso é uma herança que não mostro para os outros para não expôr as deficiências alheias, mas é onde a gente olha e fala: Valeu!




Jiu-Jitsu Olímpíco é real?

   Transformar o sonho em realidade, e sonhar com as Olimpíadas já pode ser considerado sonhar com os pés no chão. Se há bem pouco tempo isto era um sonho distante, o próprio Jiu-Jitsu se encarregou de torná-lo palpável demonstrando sua superioridade. “O Jiu-Jitsu nunca esteve tão em alta, esta é a hora de mostrar ao mundo a imagem distorcida de luta violenta que se fez devido aos Vale-Tudos, um confronto entre artes marciais que serviu para expôr a maior eficiência de uma determinada luta”, defende Ricardo Libório, Campeão Mundial Super-Pesado, que juntamente com a Confederação Brasileira de Jiu-Jitsu e outros atletas faixas pretas vêm se empenhando para pôr o esporte no pódio Olímpico. 

   Estrada pavimentada, é hora de andar sobre ela. Como é fazendo que as oportunidades aparecem, depois de um bem sucedido Campeonato Mundial, Libório e os também Campeões Mundiais Royler Gracie, Amaury Bitteti, Paulo Barroso e Wallid Ismail foram apresentados por Sócrates Mendes à platéia presente na Arena Olímpica de Copacabana na final do Campeonato Mundial de Volei, patrocinado pelo BB. Aplausos e a possibilidade de expôr suas idéias para um grupo muito especial, HélioViana, da Pelé Esportes, Bernard Haizman, que gostou tanto do projeto que já se tonou padrinho do Jiu-Jitsu nessa luta e, ninguém menos que o Presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Artur Nuzman, que prometeu que a luta participará do próximo Festival Olímpico de Verão. 

   O passo seguinte foi dado mês passado, quando o Presidente da CBJJ, Carlos Gracie Jr. entregou a Nuzman uma Placa em homenagem aos serviços prestados ao esporte. A solenidade contou com a presença de Bernard e diversos nomes da faixa preta Nacional.Visando horizontes a CBJJ se filiou ao COB. A partir daí,o que o COB decidir é lei. Assim será feito para pôr em ordem tudo que foi questionado e criticado até agora. É a unificação do esporte. 

   Para participar dos Jogos Olímpicos, o esporte deve ser praticado e disputado em 75 países e quatro continentes. Para isso, Libório espera contar com a união de todas as equipes. “Se o Jiu-Jitsu continuar nesta mentalidade de academia, de olhar para trás, nunca vai se desenvolver em níveis Olímpicos”. Para começar a pôr em prática o projeto, está programado para maio aqui na terra Brasilis, um confronto entre Brasil e Japão, com a intenção de desmistificar que é no outro lado do mundo que as artes marciais sobressaem. “É muito importante que os brasileiros defendam e vistam a camisa do Jiu-Jitsu, que é o melhor do mundo”, convoca. É a equipe brasileira caminhando para as Olimpíadas. (Não lembro onde isso foi publicado e nem se foi publicado ou se foi para patrocínio do atleta Ricardo Libório)


Revista Tatame

Uma Máquina de Lutar


   Nem pense em chegar na academia Rio Jiu-Jitsu Clube em dia de Maracã se a intenção for falar com o prof. Murilo Bustamante. Com compromisso inadiável, ele justificará a pressa com uma resposta curta e grossa: “É jogo do Flamengo”. Faixa preta de jiu-jitsu, Murilo, se não for o mais está perto de ser, é o professor mais fanático pelo clube. Tanto que até o letreiro de sua academia, contrariando seu sócio tricolor, é vermelho e preto. Não só o letreiro, o logotipo também. “Sou Flamengo mesmo, não como aqueles que não ligam para futebol”’, adianta, resignando-se que as peladas dos finais de semana tiveram que ser reduzidas para uma por ano devido ao risco de contusões, treinamento, administração da própria academia (Rio Jiu-Jitsu Club, em sociedade com Ségio Souza) e o término do curso de Economia na UERJ, previsto para este semestre. 

   Bicampeão Brasileiro de jiu-jitsu, campeão do II Universal Vale Tudo Fighting (UVF) e do I Martial Arts Reality Superfighting (MARS), Murilo não esconde o desejo de voltar a competir de kimono, só não sabe quando. “A prioridade é vale-tudo, porque é a parte profissional. Se tivesse retorno financeiro ficaria competindo jiu-jitsu que é o que eu mais gosto. Lutei minha vida inteira de kimono; você faz uma preparação profissional para ter um resultado amador”’, explica o preta, que com 30 anos, tem uma bagagem de duas décadas de Arte Suave sob os ensinamentos do Mestre Carlson Gracie. 

   Quando empatou com Tom Erickson, wrestler 40kg maior, no I MARS, a polêmica “‘tamanho x técnica”’ se intensificou ao ponto do maior evento desta modalidade, o Ultimate Figting Campionchip (UFC), ter adotado categorias de peso. Diante da possibilidade de participar do evento em julho, Murilo vem direcionando seu trabalho físico para manter seu peso. Com 1,87m e 90kg, vem enfatizando a parte aeróbica cardiovascular com corrida, natação, esteira e ergométrica, kempô, musculação, yoga, boxe, manutenção de jiu-jitsu esportivo - ministra aulas em duas academias - e uma alimentação praticamente integral. 

   Com o dia lotado, a noite e o tempo livre são dedicados à namorada Luciane. Quando não tem clássico. “Gosto de ir ao Maracanã, adoro o Maracanã”’, entusiasma-se, lembrando a final do Brasileiro de 92 - numa situação familiar ao Estadual deste ano - como o jogo que mais o marcou: ‘’Não ia ao Maracanã há muito tempo. O Botafogo era o favorito e o Flamengo ganhou de 3x0 o 1º jogo’’. 

   Caçula de cinco filhos flamenguistas, Murilo não teve muita escolha: já nasceu vestindo o manto sagrado. Mas nada que o forçasse a ser doente pelo time. Mas, uma vez Flamengo, sempre Flamengo, o presente para o temporão da família (Murilo é cinco anos mais novo que sua irmã e nove que o irmão mais velho) tornou-se uma de suas maiores paixões. Sobre o Mengão de hoje, acha que falta um jogador de valor. “Raul, Leandro, Rondinelli, Mozer, Júnior, Andrade, Adílio, Zico, Tita, Lico e Romário”, sugere, sem pestanejar, qual seria o time ideal, sabendo que está se referindo a quase toda formação de 80. “O melhor time do Flamengo”, diz, sorrindo, como se estivesse ganhando uma luta.

Revista do Flamengo

VOU DAR, PORRADA

Entre muitos socos e outros tantos, Carlos Maçaranduba se queixa à um padre de não ter mais adversários no mundo para ele. Seu fiel escudeiro, Montanha, providencia um lutador à altura: Vítor Belfort. Resultado: muito riso e mais um quadro pronto – o qual acompanhamos a gravação - para ir ao no programa Casseta e Planeta Urgente. 

Com certeza muitos que estão lendo esta matéria se identificam ou conhecem alguém que parece com o personagem que toda terça-feira à noite bate ponto e porrada na tela da Globo. “Foi a junção do máximo de boçalidades num cara só. Ele é o estereótipo desse cara, obviamente dentro do humor. É tão absurdo que é uma história em quadrinhos com cachorro voando a cem metros; é quase um desenho animado. A violência vira uma coisa de “Bip Bip”, diz o humorista Cláudio Manoel, intérprete do personagem. 

Mas nem sempre o Maçaranduba foi o espelho dos praticantes de Artes Marciais. O machão acima de qualquer suspeita – senão, “vai ter porrada” – foi criado pela turma do extinto jornal Planeta Diário e atendia pelo nome de Maçaranduba, o fodão do Bairro Peixoto. Em 97 é que o personagem que vemos hoje criou forma num quadro chamado “Diário de um macho” que os humoristas criaram em cima da notícia de um quebra-pau que teve num jogo. As semelhanças são evidentes: é o porradeiro, o lutador; não só de Jiu-Jitsu, tranqüiliza Cláudio Manoel. “Maçaranduba é um bobalhão, um cara infantil que tem muita empatia com as crianças e adolescentes, de onde vem o grande sucesso do personagem”, acredita Márcio Trigo, diretor do programa. 

E realmente, feliz ou infelizmente, o personagem é um estereótipo do atual lutador, e não dá para assistir as caras e bocas, levantadas de sobrancelha e franzidas de testa do personagem sem lembrar de algum conhecido. Cláudio diz que para dar vida ao personagem com o vocabulário típico, eles costumam conversar com lutadores e com a figuração, ler e procurar na Internet, já que nenhum deles pratica artes marciais. Desculpe, nenhum não, um se safa. “O Marcelo (Madureira) fez Judô há muito tempo. Mas era um vexame, o cara era aquele que apanhava do irmão caçula. Ele convenceu todo mundo a ir na Gama Filho assistir a uma luta. Eu sei que quando sortearam as chaves, o Marcelo pegou um cara chamado Venda, campeão da categoria. Parecia desenho animado, o cara acabou com ele em milésimos de segundo. Foi muito divertido”, recorda Cláudio. 

Quanto as duas artes marciais associadas à seu personagem – Jiu-Jitsu e Vale Tudo -, Cláudio considera a Arte Suave um fenômeno que cresce muito rápido, sinal que as pessoas querem; do Vale Tudo, uma crítica: “Tá muito chão, assistir é foda. Quando vira espetáculo, você não tá agradando mais só ao cara que é do ramo, você tá atingindo mais gente. Eu sei que é técnica, a beleza da estratégia, mas tem uma hora que não acontece nada. Eu achava o Rickson o máximo. No Boxe, por exemplo, gosto do peso pesado. Não gosto daqueles pesos leves, é bobagem minha, mas tenho a impressão que os caras tão lutando por um prato de comida, fico com pena eles. É a mesma coisa no Vale Tudo, gosto quando a luta é espetáculo, quando é travada demais me enche o saco”. 

Com relação ao evento em si, surpresa. O casseta é do time. “Acho legal e vou te dizer porque. A sociedade sempre teve e sempre terá esse tipo de duelo, de desafio que passam pela supremacia física. Não adianta você achar que um dia todos os embates serão intelectuais, é mentira. A gente tem uma coisa animal, primitiva”, explica Cláudio, que conta que eles já tentaram gravar por duas vezes eventos de vale Tudo e não foram liberados porque os organizadores acharam que eles iriam sacanear. Mas ele adverte: vai acabar rolando. 

“É gostoso fazer. Se tirassem o comportamento de algumas pessoas, seria um negócio legal. Você tá aprendendo uma habilidade, tá se cuidando”, diz, sem medo de represálias dos verdadeiros Maçarandubas: “O cara para ficar puto comigo tem que se assumir como Maçaranduba”.


PÔ!

Terminada as formalidades, incluindo tentativas de realizar uma entrevista séria – o que não é nada fácil – perguntei se seria possível o humorista encarnar o personagem e responder à La Maçaranduba. A resposta foi um clássico: “Se não tiver perguntas que duvidem da minha masculinidade. Senão, vou dar porrada! 

TATAME: Onde você nasceu? 

MAÇARANDUBA: Fui achado na porta de uma academia. Ninguém sabe de onde vim. 

T: Você foi criado por quem? 

M: Por lutadores selvagens, na Selva. 

T: E como foi sua infância? 

M: Foi boa. Apanhei muito 

T: Quando você começou a se interessar por lutas? 

M: Já nasci interessado. Só não digo que é genética e DNA, porque isso não é coisa de macho. 

T: Como é o seu dia? 

M: Acordo, dou umas porradas, tomo café, dou umas porradas, saio na rua, dou umas porradas, chego na academia e dou umas porradas e, para completar o dia, antes de dormir, dou umas porradas. 

Aproveitei a chegada do Montanha, amigo inseparável do Maçaranduba, para esclarecer, de uma vez por todas, um assunto que vem intrigando dez entre dez lutadores de jiu-jitsu 

T: Rola um boato que você e o Maçaranduba seriam a dupla dinâmica (Batman e Robin) do Jiu-Jitsu. É sério? 

MONTANHA: Essa relação é espada, e se você estiver duvidando da nossa masculinidade, vai entrar na porrada 

T: Só mais uma coisa, como você se define? 

MONTANHA: Sou o escudeiro do Maçaranduba. Sou o cérebro dele, penso por ele. 


CASSETA E PLANETA, URGENTE!

GANGUES! Assim são chamados, hoje em dia, os lutadores de jiu-jitsu. É isso que andam ensinando nas academias? O que fizeram com a filosofia da Arte ensinada com maestria por mais de 70 anos? Na entrevista que fiz com o casseta Cláudio Manoel, o humorista deixou de rir, e de fazer rir, para comentar sobre a atual utilização das Artes Marciais. É bom para todos pensarem se é isso o que querem, se é assim que nutrem a “doce ilusão” de chegar a algum lugar. Principalmente aqueles que fazem das lutas seu meio de sobrevivência. 

“É grave porque enquanto as pessoas estão discutindo, tem alguém sendo dilacerado, mutilado. Pode ser você, seu filho, pode ser qualquer um. As pessoas devem ver que estão mexendo com uma coisa séria. Acho que os profissionais do esporte e do setor - hoje você tem academias, revistas - devem ficar cada vez mais atentos à isso, porque se é, e eu concordo que seja, uma distorção, um mal uso do que a pessoa aprende, essas pessoas diretamente interessadas na sobrevivência e boa imagem do esporte devem coibir isso. Você deve ter uma atuação junto as autoridades porque acho que já passou do limite do bom senso”, disse Cláudio Manoel.





Tatame ano 5 # 38

Um Octagon Quadrado e De Cordas

     Como no Brasil “promessa é dúvida”, a arena das lutas do VI UVF - que prometia um octagon nos moldes do Ultimate Fighting Championship (UFC) - acabou mesmo sendo o velho e bom ringue do Santa Rosa, salvador da pátria de várias competições. Para um evento de nível, como o UVF se propõe a ser, esta realidade parecia surreal. 

   Numa prova concreta de o que todos já previam, logo na primeira luta, o ringue não suportou. Na primeira tentativa de levar para o chão os dois foram arremessados para fora, com o obeso Geza caindo por cima. Num reflexo, Carlão colou o queixo no peito evitando o que poderia ter sido um acidente de graves consequências. Para não esquecer o tombo, o brasileiro fez suas três lutas com as costas e o cotovelo esfoliados. A luta teve que ser interrompida para repor e reforçar as cordas. 

   Quanto a este “pequeno detalhe”, a verdade é que não dava para acreditar que o evento exibia no palco da maior casa de shows da América Latina um simples ringue, completamente desnivelado e que não suportava o peso dos lutadores. Pior ainda era acreditar na história - verídica - de o porque da situação. O caminhão que trazia de Campos, Rio, o octagon alugado pela produção do evento quebrou e, incrivelmente, perdeu-se na Capital não encontrando o Metropolitan. 

   Em número de quedas, Ebenezer Fontes foi insuperável. Seu confronto com Randelman foi um cai e sobe do ringue interminável. Isso sem contar que, na maioria dos combates, os lutadores ficavam com parte do corpo mais para fora que dentro do ringue, tendo que ser escorados pela multidão que se aglomerava na área que, teoricamente, deveria ser restrita à Imprensa. 

   Pouco antes do início desta luta, Vander (Jiu-Jitsu) e Pinguim (Luta Livre) se estranharam e começaram uma briga que, se estendeu pelo estacionamento e só teve fim na academia do professor de Vander. Para João Alberto Barreto, organizador do evento, essas atitudes “eram normais”, e a falta do octagon em nada atrapalhava as lutas nem instigava a torcida. “No meu tempo os ringues eram assim”, ressaltava, ao mesmo tempo em que rolava a confusão envolvendo Mark Coleman. 

   Nos bastidores, antes do torneio começar, Jorge Pereira (Jiu-Jitsu) e The Pedro (Luta Livre) já haviam protagonizado o primeiro Vale-Tudo de graça da noite. Jorge chegou cobrando de The Pedro quando seria a vez deles se enfrentarem, o que acabou acontecendo ali mesmo. Para finalizar com chave de lata, Alessandro Alves e Beto quiseram resolver no mano-a-mano as desavenças entre seus professores, Rickson Gracie e Hugo Duarte, respectivamente. As provocações começaram na entrada, mal-estar abafado por Hugo. Mas antes da final, não teve santo que os fizesse comportarem-se. Um extintor de incêndio teve que ser usado para pô-los em seus lugares. Atitudes como as desses “atletas” devem ser repudiadas, visando o crescimento das duas Artes. 

   Mas a noite do VI UVF começou diferente, com a disputa entre oito card girls. As garotas, acostumadas a uma simples volta anunciando os lutadores, eram convocadas pelo locutor, vermelho e com as veias saltando, para desfilar no ringue numa narração pra lá de entusiasta, atiçando mais ainda o público 90% masculino. A escolha da Miss Universal,. realizada antes da final, acabou anunciando também o campeão do evento. Enquanto Amanda Lee, escolhida a nº 1, desfilava com a brasileira, Cláudia “Xica da Silva”, a nº 2, empunhava a americana 


Texto publicado na revista Tatame, Ano 3 # 20, Abril de 1997. Reportagem sobre o UVC VI

8 de novembro de 2012

As benções do meu avô


BS”D
Quando começou o Shabat, fui até a estante procurar um livro que me contasse uma história ou que simplesmente fosse mais “light”. Arrumei os livros e separei um para ler, como faço todo Shabat. Peguei um livro chamado “As benções do meu avô”, de Rachel Naomi Remen. O que me fez comprar este livro provavelmente uns oito anos atrás eu não lembro. Com certeza deve te sido a título. Criada e educada pela minha avó, com saudades e tudo o mais, o nome do livro deve ter me chamado a atenção. Verificar que a autora era judia deve ter sido o martelo para a compra e leitura do mesmo.
Bem, hoje o reli. A autora é uma médica que aconselha pacientes com câncer ou terminais e mescla em suas narrativas, estórias de seus pacientes, de sua família aos ensinamentos de seu avô, um rabino ortodoxo originário da Rússia que migrara com a família para os USA no início do século XX, em decorrência dos pogroms no Leste Europeu.
Se no texto anterior eu falei sobre o processo de teshuvá, este fala mais sobre este retorno de uma forma mais prática.
Eu comecei minha teshuvá quando voltei da minha primeira viagem a Israel. Em algum momento, comprei e li este livro e eu lembro que chorei muito e muito sentada no chão do meu apartamento, pedindo perdão à D´us e à minha avó. D´s me colocou no mundo com algum objetivo que aquela altura eu tinha me distanciado, e eu tinha certeza que tinha envergonhado minha avó que tinha me educado para ser este ser que D´s queria. E, ela ao lado de D´s, devia estar envergonhada. Eu chorava, pedia perdão e prometia nunca mais fazer nada do que fizera até então e que honraria sua memória.
A vida depende de nossa lealdade.
Minha avó é uma das almas que sobreviveram ao Holocausto, saíram de onde viviam e tiveram que iniciar suas vidas em países distantes e diferentes. Meus avós vieram para o Brasil aconselhados por um cunhado da minha avó, que veio para cá antes. Meus avós saíram dos campos de concentração e foram para a Itália. De lá, vieram para o Brasil. Alguém já parou para pensar como estas pessoas possuem almas elevadas, como são pessoas sábias? Eles passaram o horror numa guerra mundial, tiveram que se mudar para países onde nem sequer falavam a língua. Constituíram família, trabalharam, criaram seus filhos. E nesta educação nunca esteve presente o sentimento de ódio ou vingança.
Eu posso falar disso com propriedade, pois minha avó nunca me passou estes sentimentos, nem nas inúmeras vezes em que contava suas experiências durante a Shoá. Estas pessoas souberam abençoar a vida e escolheram viver.
Logo no começo, a autora relata: “Quando eu era criança, parecia estar presa entre duas visões totalmente diferentes da vida: meu avô e seu sentido da natureza sagrada do mundo, e meus tios, tias e primos e sua postura altamente acadêmica, voltada para a pesquisa”.
Muitas vezes, para agradar a sociedade, ao mundo, ou mesmo aos nossos pais, nos transformamos em pessoas diferentes de nós mesmos. Outras vezes, isto é parte de uma defesa contra o mundo que adquirimos. A verdade é que em algum momento temos que escolher sobreviver ou viver.  E eu estava disposta a escolher a vida.
“Quando não vivemos de maneira coerente com nossos próprios valores, alguma coisa dentro de nós começa a se corroer”
Então, quando eu sentei no chão do apartamento e chorei, eu queria mais do que tudo deixar de viver na defensiva. Deixar de ser uma criação de mim mesma. E, B”H, consegui. Comecei algo que não terá fim nunca: estudar Torá. Procurei uma rabanit para me ensinar o que eu não tinha aprendido e me ajudar nesta trajetória da teshuvá. Minha avó não estava mais entre nós, ela faleceu em 1991. Desde que ela morreu, ninguém mais me chamou de “mine sheine meidele”.
Como escrevi no outro texto, quando decidimos fazer teshuvá e viver judaicamente, ou seja, viver como nascemos para viver, não devemos teimar em trilhar os mesmos caminhos que trilhávamos outrora. Tem uma história que fala sobre isso. Diz assim: Era uma vez uma rua, não vi o buraco e cai. Fiquei muito tempo ali até que consegui sair. Depois, passei pela mesma rua, cai no mesmo buraco. Demorei menos tempo para sair. Peguei outra rua.
Fiz isso diligentemente durante oito anos. Não sei porque nem o que me levou a pegar esta “rua” novamente. O fato é que achei que poderia passar sem sequer me importar com o buraco. E, realmente, não vi nem cai no buraco, mas quando já abandonamos determinadas estradas e comportamentos, quando o trazemos de novo para nossa vida, eles machucam nossa alma. Nosso corpo fica intacto com esta derrapada, mas nosso ser nem tanto. Em determinado ponto de nossa subida espiritual, sabemos e sentimos o que nos faz bem e o que D´s proíbe para nós porque não faz parte da Vida como Ele nos outorgou.
Hoje, mais de um ano após ter abandonado esta rua, consegui enfim abandonar o rancor. Que muitas vezes era muito mais contra mim mesma que pelo outro. De qualquer forma, hoje me sinto como minha avó gostaria de me ver. Hoje, consegui sentir meu colo e deitei minha cabeça nele esperando e recendo seu carinho.

Marcella Becker Warszawski – 16/outubro/2011 (ec)
Em leilui nishmat de Raisel bat Yankel, Moses ben Mendel, Sara bat Yankel, Sara bat Yankel e Ester bat Yankel


Teshuvá


Teshuvá, teshuvá, teshuvá.... Mas, afinal o que significa esta palavra que não param de falar desde o mês de Elul?
Bem, para começar a explicar, precisamos trazer a tradução correta da palavra Teshuvá, que por si só já explica muita coisa. Muitas vezes traduzida erradamente como “arrependimento”, Teshuvá significa “retorno”. Mas, retorno ao o que é a pergunta clássica. É um retorno a quem realmente nascemos para ser.
Um yehudi nasce com um objetivo neste mundo, que lhe foi outorgado por D´s antes de seu nascimento. Tipo, D´s fez com que nascêssemos de nossos pais porque temos uma missão a cumprir aqui sendo quem nós somos. E quando um yehudi nasce, ele recebe de D´s uma parte da Alma Divina. E D´s só nos pede que tomemos conta desta alma e que façamos o que Ele nos recomendou quando nos outorgou a Torá: seguir Seus mandamentos, trazendo santidade para este mundo material e transformando este mundo numa morada para Ele.
Mas D´s, em sua infinita Sabedoria já sabia que o homem cometeria diversos erros e antes mesmo de criar o mundo, criou a teshuvá (*1). E quem foi o primeiro homem que utilizou este conceito? Foi Caim, que ao ser interpelado por D´s depois de matar Abel, se arrependeu do que fez e assim poupou sua vida. Caim fez teshuvá antes mesmo de seu pai, Adam. De acordo com as Hagadot, Adam ao ver a teshuvá de Caim, disse: “Se eu soubesse que era tão fácil ter a vida de novo, já teria feito isso há muito tempo”.
Este é outro conceito muito importante que nossa sagrada Torá nos traz: que nunca é tarde para voltarmos ao nosso caminho. Ok, ok... Muito bonitinho tudo isso, mas não adiantará nada se você não entender, né? Então, vamos visualizar.
Imagine uma linha reta. Este caminho tem dois pontos somente: você e D´s. Simples, assim. E seria ótimo se conseguíssemos seguir este caminho sem sobressaltos. Mas, como disse o Rebe Nachman de Breslov, “a vida é uma ponte muito estreita e o importante é não ter medo”.
Só os tsadikim conseguem chegar até D´s sem nenhum arranhão. Nós, como seres humanos, escorregamos, vacilamos, criamos bifurcações onde não existiam, retornos desnecessários, saídas que levam à outras estradas... E assim vamos vivendo erradamente.
D´s concedeu ao homem o livre arbítrio, que é a capacidade que nenhuma outra criação tem de pensar e falar. Lembram daquela linha que era pra ser nossa vida desde nosso nascimento? Então, D´s jamais nos abandona, ao contrário: seja lá onde formos parar, D´s em Sua infinita bondade, nos aguarda de braços abertos ao lado daquela linha para quando voltarmos à Seu caminho.
Mas, com tantas pessoas neste mundo, porque D´s precisa justamente de mim ou de você? Porque D´s nos criou para sermos seus parceiros na criação do mundo. Em uma das últimas parashiot da Torá, D´s adverte o homem: “Vê que hoje coloquei diante de ti o bem e o mal, a vida e a morte.... Escolhe pois a vida”. O Talmud Yerushalmi traz: “Perguntaram à sabedoria: ‘Qual é a punição do pecador’? Respondeu a sabedoria: ‘o mal perseguirá os transgressores’. Perguntaram à profecia: ‘Qual é a punição do pecador’? Respondeu: ‘A alma pecadora falecerá’. Perguntaram à Torá, e ela respondeu: ‘Traga uma oferenda e será perdoado’. Perguntaram à D´s e Ele disse: Faça teshuvá e será perdoado’”.
E como deve ser feita a teshuvá de verdade? Em primeiro lugar, devemos ter em mente que só seremos bem sucedidos se abandonarmos aquele caminho errado. Porque com certeza cairemos nele de novo. E, não adianta teimar com D´s que conseguiremos andar por aquele caminho que já nos levou a errar tanto mas que seremos fortes e não cairemos em tentação, porque não é assim que acontece na vida real. Somo seres falíveis. De acordo com o Rambam, em seu livro Halachot Teshuvá,  a mesma é constituída de quatro partes: arrependimento, confissão oral, abandono da transgressão e a resolução de nunca mais agir da mesma maneira. Estes passos devem ser verdadeiros, porque podemos enganar os outros e até a nós mesmos, mas nunca a D´s, e só Ele que nos interessa.
Gmar vechatimá tová,
Marcella Becker Warszawski

(*1) Sete coisas foram criadas antes do mundo: Torá, teshuvá, Gan Éden, Guehinom, Trono celestial, Templo Sagrado e o Nome de Maschiach.